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Então, o que é leucemia mesmo?

Quando se pronuncia a palavra “leucemia” a maior parte das pessoas entra em pânico e, em geral, o que se segue é um silêncio difícil de ser revertido. Todos sabem o quanto leucemia é grave. Todos sabem que existe risco de vida. O que a maioria não sabe é que leucemia não é apenas uma doença. São várias entidades e cada uma delas tem apresentação, prognóstico e tratamento diferentes. As leucemias podem, inicialmente ser classificadas em:

  • Leucemia Linfoide Crônica (LLC)
  • Leucemia Mieloide Crônica (LMC)
  • Leucemia Mieloide Aguda (LMA)
  • Leucemia Linfoide Aguda (LLA)

 

Figura 1: Representação esquemática da medula óssea e da gênese da leucemia mieloide aguda.

Medula óssea e LMA

 

Leucemias Crônicas

 

Alguns subtipos de leucemia são, hoje, na verdade, doenças crônicas, onde o paciente tem uma qualidade de vida realmente boa. Avanços na Medicina permitiram que alguns não usem nenhuma ou usem pouca quimioterapia. As internações são menos frequentes. Estas são chamadas de leucemias crônicas, que exigem acompanhamento médico para o resto da vida, mas o portador pode ter uma vida relativamente normal.  A condição clínica desses pacientes se assemelha mais com a de alguém com diabetes ou hipertensão do que com a vida de outros pacientes oncológicos. Os efeitos colaterais  como náuseas,  queda de cabelo, aumento do risco de infecção, são bem mais brandos. 

 

  • Boa parte das pessoas com Leucemia Linfoide Crônica (LLC) ficarão sem medicação, aguardando o momento certo para iniciar o tratamento, que segue alguns critérios recomendados pelos grandes centros internacionais. Quando indicado, os tratamentos são administrados de forma endovenosa com infusões intermitentes, dentro de um período de aproximadamente 6 meses e, atualmente, grupos selecionados de pacientes podem utilizar medicação oral (neste caso de forma contínua, sem previsão de interrupção do tratamento). Nesse período, alguns efeitos colaterais podem ser importantes, mas avanços na Medicina permitem minimizar esses efeitos. A maioria dos casos entra em remissão (doença controlada) por um longo período, de meses a anos. Caso a doença recidive, o que pode acontecer em todos os casos (o que varia é o intervalo que a doença permanece em remissão) haverá necessidade de revisar o tratamento e, eventualmente, utilizar um esquema de segunda linha.

 

  • Já nos casos de Leucemia Mieloide Crônica (LMC), o tratamento precisa iniciar assim que o diagnóstico é feito para todos os casos. O tratamento utiliza  medicação oral pelo resto da vida, mas os efeitos colaterais são bem discretos, quando existem. Poucos pacientes irão apresentar recaída e necessitar de revisão de tratamento. No entanto, medicações para segunda linha já estão disponíveis e se a doença não responder, alguns raros pacientes irão precisar de transplante de células tronco (antigamente chamado de transplante de medula óssea.

 

Leucemias Agudas

 

Quanto às leucemias agudas (LMA e LLA), essas ainda precisam de tratamento agressivo, com quimioterapia mesmo. O paciente vai precisar receber muitas bolsas de sangue (concentrados de hemácias e plaquetas) e podem precisar de internação em vários momentos. Na infância os resultados são bem melhores que nos adultos. O tratamento de idosos, pela baixa tolerância à quimioterapia, ainda é considerado desafiador. Apesar de serem agrupadas por terem apresentação clínica parecida, a leucemia aguda mieloide é bem diferente da linfoide, com estratégias de tratamento completamente diferentes. São batalhas difíceis, ganhamos uma batalha de cada vez e muitas vezes ganhamos a guerra. A equipe multidisciplinar, com auxílio da nutrição, enfermagem, fisioterapia, dentre outros, são extremamente importantes. 

Recentemente algumas opções terapêuticas bem interessantes surgiram, são muito promissoras, principalmente o tratamento de alvo e aqueles baseados em imunoterapia. Neste último, onde o linfocito T do paciente se torna mais hábil a matar a célula maligna da leucemia, poupando as células normais. Ainda não estão liberados de forma sistemática no Brasil (o FDA já liberou para doenças resistentes ou refratárias) e a maioria dos casos tratados até o momento estão inseridos em ensaios clínicos. A perspectiva é que, em breve, a história da leucemia aguda vai mudar também.

 

 

Texto elaborado e revisado por
Dra. Mireille Guimarães Vaz de Campos  
Médica  do corpo clínico do INGOH
Especialista em Hematologia – Hemoterapia
CRM-GO 12.406/RQE 22965.
Texto revisado em Agosto de 2021.

 

É permitida a reprodução parcial ou total desta obra,
desde que citada a fonte e que não seja
para venda ou qualquer fim comercial
Referências:
WHO. Haemoglobin concentrations for the diagnosis of anaemia and assessment of severity. Geneva, World Health Organization, 2011 (WHO/NMH/NHD/MNM/11.1) Disponível em: http://www.who.int/vmnis/indicators/haemoglobin.pdf , (visitado em 2021). 
ZAGO MA, FALCÃO RP, PASQUINI R. Tratado de hematologia. São Paulo : Editora Atheneu, 2013. 

O que o hemograma completo avalia?

O hemograma completo é um teste que dá informação sobre os 3 principais tipos de células no sangue e mostra se seus níveis são baixos, normais ou altos.

 

1. Células vermelhas do sangue (hemácias ou eritrócitos)

Estas células contêm hemoglobina e transportam oxigênio para seu corpo.

2. Células brancas do sangue (glóbulos brancos ou leucócitos)

Estas células ajudam no combate a infecções.

O chamado diferencial dos “glóbulos brancos” (que são aqueles números que aparecem logo abaixo do total de leucócitos) informa qual a proporção de cada um dos 5 tipos diferentes de glóbulos brancos, sendo que cada tipo tem uma função diferente.O diferencial também mostra se você tem células brancas anormais do sangue, o que pode levar à suspeita de alguma doença hematológica, como as leucemias.

3. Plaquetas (trombócitos)

Plaquetas são fragmentos de citoplasma de células que têm função na coagulação e hemostasia, ou seja, ajudam a formar coágulos. O coágulo é como se fosse um “plug” que consegue estancar o sangramento após um ferimento. A formação do coágulo depende também dos fatores de coagulação, que não são avaliados no hemograma completo e sim no coagulograma.

 

O Hemograma propriamente dito….

O hemograma é o nome dado ao conjunto de avaliações das células do sangue que, reunido aos dados clínicos, permitem conclusões diagnósticas e prognósticas. A qualidade dos resultados depende da boa execução técnica, interpretação dos valores, manutenção dos equipamentos e constante controle de qualidade. 

Condições que afetam a “medula óssea”, que é o espaço no meio de seus ossos que produz todos os tipos de células do sangue, normalmente são identificadas no hemograma. Mas nem todas as alterações no hemograma refletem problemas na produção do sangue, algumas vezes as células se perdem (sangramento) ou são destruídas (doenças auto-imunes). Caso apresente uma alteração no sangue, converse com o seu médico.

O teste do hemograma informa algumas medidas como:

  • Quantidade de hemácias, plaquetas e leucócitos você tem no seu sangue
  • Quanto espaço as células vermelhas do sangue ocupam no sangue, chamado de “hematócrito”;
  • Quanta “hemoglobina” está presente (hemoglobina é a proteína que transporta oxigênio no sangue);
  • Informações sobre o tamanho e a forma das células vermelhas e plaquetas.

Seu médico provavelmente vai solicitar este teste em uma consulta de rotina ou quando estiver com sintomas tais como:

  • Cansaço e fraqueza;
  • Sangramento maior que o normal em qualquer região do corpo: fezes, urina, fluxo menstrual, da pele, do nariz ou das gengivas;
  • Aparecimento de manchas roxas grandes ou em grande quantidade;
  • Se há suspeita de infecção.

 

Analisando cada série…

1. Células vermelhas do sangue (hemácias ou eritrócitos):

As necessidades fisiológicas específicas de glóbulos vermelhos variam de acordo com aspectos individuais da pessoa como idade, sexo, altura da residência em relação ao nível do mar (altitude), tabagismo e diferentes fases da gravidez. Os glóbulos vermelhos contêm hemoglobina e transportam oxigênio para o corpo. A análise da série vermelha (ou eritroide) é constituída pelas seguintes determinações básicas, que podem ser agrupados em 

  • métodos quantitativos (RBC, Hb, Ht) e 
  • métodos qualitativos, que incluem: (a) índices hemantimétricos (VCM, HCM, CHCM), e avaliação de (b) formação de rouleaux (ou empilhamento de hemácias); (c) variação no tamanho (anisocitose), como microcitose e macrocitose; (d) distribuição da hemoglobina, como hipocromia, hemácias em alvo; (e) presença de inclusões; (f) variações na forma (poiquilocitose), (g) policromasia, que corresponde aos reticulócitos (quando é utilizada a coloração de azul de cresil brilhante) e (h) presença de eritroblastos, que são células vermelhas jovens nucleadas.

Quando as hemácias estão em pequeno número, chamamos de anemia. A anemia é classificada de várias formas, a mais comum se baseia na hemoglobina (Hb). Segue abaixo (Tabela 1) uma classificação genérica baseada nas informações da Organização Mundial de Saúde. Mas os valores normais podem variar conforme a fonte consultada e os aspectos acima mencionados

Tabela 1: Níveis de hemoglobina para diagnóstico de anemia ao nível do mar.
População
Não é anemia
Anemia Leve
Anemia Moderada
Anemia Grave
Crianças
6 meses – 5 anos
≥ 11,0 g/dL
10,0 – 10,9 g/dL
7,0-9,9 g/dL
<7,0 g/dL
Crianças
5-11 anos
≥ 11,5g/dL
11,0 – 11,4 g/dL
8,0-10,9 g/dL
<8,0 g/dL
Crianças
12-14 anos
≥ 12,0 g/dL
11,0 – 11,9 g/dL
8,0-10,9 g/dL
<8,0 g/dL
Mulher não grávida
(> 15 anos)
≥ 12,0 g/dL
11,0 – 11,9 g/dL
8,0-10,9 g/dL
<8,0 g/dL
Mulher grávida
(> 15 anos
≥ 11,0 g/dL
10,0 – 10,9 g/dL
7,0-9,9 g/dL
<7,0 g/dL
Homem
(> 15 anos)
≥ 13,0 g/dL
11,0 – 12,9 g/dL
8,0-10,9 g/dL
<8,0 g/dL
Fonte: Modificado de OMS, 2011.

Quando estão em grande quantidade, chamamos de policitemia. Consideramos útil utilizar os valores definidos para investigação de neoplasia mieloproliferativa neste caso. Então se sua hemoglobina está maior que 16,0 g/dL (mulheres) ou 16,5g/dL para homens, é importante procurar um especialista (hematologista).

 

2. Série Branca:

A Tabela 2 mostra os níveis usualmente utilizados para analisar a série branca, lembrando que existe uma grande variação entre indivíduos, principalmente de grupos étnicos diferentes. Assim, se seus valores não estiverem normais, é importante conversar com seu médico de confiança e caso a dúvida persista procurar o médico especialista (hematologista). O diferencial também mostra se existem células brancas anormais no sangue periférico. No leucograma chamamos de (1) medidas quantitativas a contagem total de leucócitos (leucometria) e o diferencial (percentual e contagem absoluta) e de (2) medidas qualitativas, a avaliação de desvio à esquerda, granulações tóxicas, linfócitos atípicos, hipersegmentação, cromatina sexual, corpos de Döhle e alterações tipo Pelger-Hüet. A presença de blastos no hemograma é um sinal de alerta e o especialista deve ser consultado o mais rápido possível.

Tabela 2: Análise diferencial de glóbulos brancos (valores normais)
%
/mm3
Neutrófilos
40 a 70
1.500-7.000
Eosinófilos
1 – 6
100 – 600
Basófilos
0 – 3
0 – 200
Linfócitos
18 – 48
1.000 – 5.000
Monócitos
3 – 10
200 – 1.000

Quando os glóbulos brancos estão aumentados em número, chamamos de leucocitose. Mais importante que saber que há um aumento de leucócitos é identificar qual subtipo celular está aumentado. Se são os neutrófilos, chamamos neutrofilia, que pode acontecer nas infecções bacterianas, por exemplo. Se são linfócitos, chamamos de linfocitose. Qualquer alteração deste tipo pode estar associada a doenças do sangue, mas na grande maioria dos casos são reações do organismo a infecções ou quadros inflamatórios.

Quando estão em pequeno número, chamamos de leucopenia. Se a leucopenia acontece por  redução dos neutrófilos (neutropenia), pode haver risco aumentado de infecções e este risco é maior quando os níveis de neutrófilos são menores.

  • Neutrófilos entre 1500 e 1000: neutropenia leve
  • Neutrófilos entre 1000 e 500: neutropenia moderada
  • Neutrófilos < 500: neutropenia importante.

 

3. Série Plaquetária

Quando se avalia a série plaquetária também temos (1) método quantitativo – contagem total de plaquetas (plaquetometria) e (2) métodos qualitativos, representado VPM, com pouco valor prático, e pelo estudo da morfologia.

Quando as plaquetas apresentam um número aumentado, chamamos de plaquetose (ou trombocitose). Consideramos útil utilizar os valores definidos para investigação de neoplasia mieloproliferativa neste caso. Então se sua contagem de plaquetas está maior 450.000/mm3, é importante procurar um especialista (hematologista);

Quando estão em pequeno número, chamamos plaquetopenia (ou trombocitopenia). Nesta situação pode haver sangramento, dependendo do grau da plaquetopenia:

  • < 10.000 à risco de sangramento espontâneo
  • < 50.000 à risco de sangramento quando submetido a trauma ou procedimentos de pequeno e médio porte
  • < 100.000 à risco de sangramento quando submetido a trauma ou procedimentos de grande porte (cirurgia da cabeça, do coração ou dos olhos)

 

É importante entender que o hemograma completo avalia apenas os itens discutidos acima.

Para avaliar outras condições é necessário solicitar exames específicos, que apenas seu médico consegue definir após uma consulta. Assim, para avaliar:

– Colesterol, é necessário a dosagem de colesterol e frações ou lipidograma;

– Diabetes, é necessário dosar a glicemia;

– Alterações no rim é necessário Uréia e Creatinina, dentre outros;

– Alterações no fígado: TGO, TGP, GGT, Fosfatase Alcalina, Bilirrubina total e frações, Coagulograma e Proteinograma, dentre outros.

 

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Texto elaborado e revisado por
Dra. Mireille Guimarães Vaz de Campos  
Médica  do corpo clínico do INGOH
Especialista em Hematologia – Hemoterapia
CRM-GO 12.406/RQE 22965.
Texto revisado em Junho de 2021.

 

É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para venda ou qualquer fim comercial

Referências:
  • FELGAR RE, RYAN DH. Capítulo 158. Automated Analysis of blood cell. In: Hoffman et al, Hematology, basic principals and practice, 4. edição. 2005.
  • BAIN BJ, FRACP, PATH RFC. Diagnosis from the Blood Smear. N Engl J Med 2005;353:498-507. (DOI: 10.1056/NEJMra043442)
  • NAUM PC & NAUM FA. Interpretação laboratorial do hemograma. Disponível em: http://www.ciencianews.com.br/arquivos/ACET/IMAGENS/Artigos_cientificos/Interphemo.pdf , (visitado em 2021). 
  • WHO. Haemoglobin concentrations for the diagnosis of anaemia and assessment of severity. Geneva, World Health Organization, 2011 (WHO/NMH/NHD/MNM/11.1) Disponível em: http://www.who.int/vmnis/indicators/haemoglobin.pdf , (visitado em 2021). 
  • ZAGO MA, FALCÃO RP, PASQUINI R. Tratado de hematologia. São Paulo : Editora Atheneu, 2013.